segunda-feira, 28 de março de 2016

Cerveja e cultura

Coluna Happy Hour publicada por Ronaldo Morado na Revista Roteiro em 15/02/2015


"Hoje é sexta-feira, chega de canseira, nada de tristeza, pega uma cerveja, põe na minha mesa."
Leandro & Leonardo em Cerveja

Cerveja é a bebida da celebração, da confraternização, do coletivo. Como escreveu mestre Antônio Houaiss: “Desde muito cedo as cervejarias, em várias partes do mundo, se fizeram enormes ambientes, extremamente conviviais, risonhos, extrovertidos, ridentes, cantantes, dançantes até.”

Nas culturas em que a bebida alcoólica é admitida, todas as festividades são regadas a cerveja – desde uma simples reunião entre amigos para o churrasco na laje até os espetáculos coletivos nas mais diversas arenas esportivas.

Essa ligação entre o festivo e a cerveja não é resultado de campanhas publicitárias, mas, ao contrário, é uma relação natural explorada ao extremo pelo merchandising - para o bem ou para o mal. Bares, pubs, biergartens etc são apenas locais explorados comercialmente para explorar a vontade e o impulso das pessoas se reunirem em torno da inspiração, do brinde e da conspiração.

Afinal, cerveja não é uma bebida que isola as pessoas. Mais uma vez, o mestre Antônio Houaiss nos disse: “Os bebedores solitários de cerveja são poucos e não estão bem, ou falta-lhes, no momento, um amigo”.

Essa bebida, fraternal por essência, não se apega a rituais e não combina com cerimônias. É relaxada, descompromissada, liberal e extrovertida. Ela está na raiz da cultura ocidental e se mantém relevante até hoje como elemento integrador. Não é apenas uma bebida, porque traz consigo um conjunto de valores culturais capazes de promover, não na teoria, mas na prática do cotidiano, a disseminação de conceitos importantes de cooperativismo, tradição, confraternização e, afinal, encontro de pessoas.

Mas por que a cerveja é tão popular? É certo que não é apenas pelo preço relativamente barato, pelo baixo teor alcoólico nem pela refrescância, visto que existem bebidas alcoólicas mais baratas, como a cachaça ou aquelas aromatizadas e refrescantes, como as “alcoolpop”, que nem por isso conseguem a popularidade da cerveja.

Eu acho que a cerveja é assim querida porque traz consigo tradição, sabor e, desde que dela não se abuse, provoca descontração e alegria. Um de seus maiores apelos é a simplicidade: é despretensiosa, não está associada a nenhuma pompa ou circunstância, apenas à alegria pura e simples.

Considerada alimento durante a quase totalidade do tempo de sua história de mais de seis mil anos, e integrante obrigatória da dieta familiar desde os primórdios da humanidade, a cerveja tem também um passado abonado pelos religiosos cristãos (católicos e protestantes), por intelectuais, filósofos, gênios e políticos. E assim continuará sendo pelos próximos milênios. Afinal, há muita alegria no encontro refrescante das pessoas. Como disse Benjamin Franklin, escritor, cientista e pai da independência americana: “No vinho encontramos sabedoria, na cerveja liberdade e na água bactérias”.

quinta-feira, 24 de março de 2016

Cerveja de quê?

Coluna Happy Hour publicada por Ronaldo Morado na Revista Roteiro em 15/01/2015


“Isso é cereal, com o qual qualquer idiota pode fazer pão; mas Deus quis uma forma mais divina de consumo. Vamos louvá-lo e glorificá-lo pela cerveja”.
Frei Tuck, personagem da história ficcional de Robin Hood.

Todos sabem que cerveja é uma bebida alcoólica fermentada a partir de cereais. Mas poucos conhecem algumas detalhes e curiosidades interessantes.

Antes de mais nada, vamos esclarecer. Entre as bebidas alcoólicas fermentadas, temos o hidromel feito a partir do mel, a cidra produzida de maçã ou pera, o vinho a partir da uva, o saquê a partir do arroz e a chicha (bebida ancestral de povos indígenas dos Andes) feita de milho.

Apesar de ser uma bebida alcoólica fermentada a partir de cevada, obrigatoriamente, a cerveja pode ter em sua receita outros cereais (trigo, arroz, aveia, milho etc). Mas surge uma dúvida: para fabricar álcool, precisamos de açúcar. De onde vem o açúcar para fazer cerveja, já que os grãos de cereal são ricos em amido e não contêm açúcar?

Precisamos do cereal maltado (adocicado). O homem primitivo (10.000 a.C.) descobriu, por acaso, que deixar os ramos de cereal de molho em água faz com que eles germinem. Ao germinarem, os grãos secos se umidificam e quebram as moléculas de amido, transformando-as em... açúcar. A esses grãos modificados e doces chamamos atualmente de malte.

Pronto! Já temos o ingrediente básico para fazer álcool – oops... para fazer cerveja. Agora vamos às formalidades. Quando a receita usa apenas malte de cevada, a cerveja é chamada de puro malte. Quando a receita usa outros cereais, além da cevada, e em quantidades superiores a ela, deve ser chamada de cerveja do cereal dominante. Exemplo: 49% de cevada e 51% de aveia = cerveja de aveia. O mesmo principio se aplica a cervejas de trigo etc. Mas importante: a bebida deve ter, no minimo, 50% de malte de cevada para ser rotulada de cerveja.

Existem muitas variações sobre o tema. Desde o uso de outros cereais, alguns não maltados, e de ingredientes transgênicos até o acréscimo de adjuntos cervejeiros (frutas, corantes, outros açúcares etc). Sobre isso seriam necessárias várias páginas de esclarecimento. Para essas questões, cada país possui regulações próprias.

Para finalizar, uma curiosidade: você sabia que o uísque é produzido a partir de uma cerveja? Sim. Pronta a cerveja básica, sem acrécimo de lúpulo ou adjuntos, ela é destilada. Se isso for feito a partir de uma cerveja puro malte, teremos um uísque puro malte. Simples? Nem sempre. Como no caso da cerveja, existem incontáveis variações sobre o tema, que exigiriam muitas páginas desta revista.